STF
começa julgar ação de inconstitucionalidade (ADIN) da OAB que questiona doações
de empresas às campanhas políticas.
Empresas podem fazer doações a candidatos? Pela legislação atual, sim. O
sistema traz distorções? Com certeza.
Dos R$ 6 bilhões arrecadados nas eleições de 2010, 97% vieram de
contribuições feitas por pessoas jurídicas. Pesquisas demonstram, ademais, que,
quanto mais dinheiro recebe um candidato, maior sua chance de se eleger. O
custo médio de um deputado federal está em R$ 1 milhão, e o de um senador é
quatro vezes mais.
A exposição foi feita em menos de dez minutos, pela advogada Aline
Osório, no início da sessão de ontem do Supremo Tribunal Federal.
Seria o caso de propor uma reforma política no Congresso, para diminuir
ou regular os gastos eleitorais? Para outro orador da sessão de ontem, isso
seria irrealista: a cobra nunca morde a mão que a alimenta.
O autor da frase, bastante expressiva mas sem maior relevância jurídica,
foi Bruno Collares Alves, falando em nome do PSTU. Assim como Aline Osório, ele
era um dos "amici curiae", termo que designa partes interessadas num
processo, às quais é concedido o direito de fazer sustentação num tribunal.
Outros debatedores não recorreram a raciocínio tão extremado. Raimundo
Aragão falou em nome do Movimento Contra a Corrupção, que agrega associações
recém-saídas do sucesso obtido com a aprovação da Lei da Ficha Limpa.
Ao contrário do que aconteceu na Ficha Limpa, explicou, torna-se
desnecessário propor uma nova lei para proibir doações de empresas. Basta fazer
o que já está previsto na Carta de 1988.
Era também este o argumento da Ordem dos Advogados do Brasil, que propôs
a ação no Supremo Tribunal. Afinal, a Constituição estabelece que todo poder
emana do povo. Povo nada mais é que o conjunto dos indivíduos, dos cidadãos.
Uma empresa, uma pessoa jurídica, não é um indivíduo. Não tem o direito
de votar, por exemplo. Não deveria ter, por conseguinte, o direito de financiar
campanhas políticas. Que um empresário faça isso é uma coisa. Que uma pessoa
jurídica faça o mesmo --isso seria inconstitucional. Revogue-se, portanto, a
lei que permite esse tipo de coisa.
No campo oposto, estava a Advocacia Geral da União. A sustentação de
Luís Inácio Adams foi a mais fraca e desconjuntada da tarde. O advogado-geral
lembrou que, em grandes democracias como a Inglaterra e os Estados Unidos, era
permitida a doação de empresas a candidatos.
Joaquim Barbosa corrigiu na hora a afirmação: isso é proibido nos EUA. O
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e mais tarde Luiz Fux, reforçaram
o ponto de Barbosa.
O advogado-geral tentou outros caminhos. Vejam, a igualdade absoluta não
existe. Um empresário tem mais dinheiro a doar do que um assalariado qualquer.
Partidos com mais votos têm mais tempo na televisão. Um candidato como Enéas
teve ampla votação com mínimos recursos...
O presidente do STF não conseguia engolir tais raciocínios. A questão
era puramente constitucional: pessoas jurídicas têm direitos políticos, como o
de financiar um candidato, ou não? Barbosa apoiava a tese da OAB.
Luiz Fux, relator do processo, foi na mesma linha. Condenou o
financiamento empresarial de todos os ângulos possíveis, alternando entusiasmo
e técnica, empirismo prático e teoria alemã.
Nenhum ponto constitucional seria atingido pela proibição desse
financiamento, acrescentou. Fux ganhou um aparte favorável de Dias Toffoli, que
mal se continha ao longo do julgamento: sabemos bem a ideologia que essas
empresas representam...
Tirania do poder econômico, ultraje à igualdade política,
plutocratização do sistema, rabo preso dos representantes: Fux ia longe no seu
voto, e não só na questão das empresas. Defendeu que também se limitem as
doações de pessoas físicas e até o uso de recursos dos candidatos nas próprias
campanhas.
Teori Zavascki pediu vista do processo; mas nada impediu um cansado
Joaquim Barbosa de anunciar ainda ontem seu voto, apoiando e radicalizando
alguns detalhes de Fux, com críticas maiores ao Congresso.
Trata-se de evitar o "toma lá, dá cá", resumiu. Se o STF
seguir essa tendência, é provável que a dureza de suas decisões no mensalão
acabe parecendo fichinha no futuro.
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